sábado, 21 de maio de 2011

Um Lugar para Chamar de Seu

E enquanto morar debaixo desse teto, tá me ouvindo, me deve satisfação. É a frase que muitos filhos devem ter ouvido de seus pais, descontado o tom mais ou menos agressivo e autoritário, que vai variar de pai para pai, e de filho para filho também, afinal estamos longe de sermos bons exemplos, justiça seja feita.

Nem sempre a saída é compulsória, ânimos que se agitam, estopim que resulta com um dos lados (quase sempre o do filho) de mala feita, a caminho sabe-se lá de onde. Às vezes, e é bom que seja assim, é só mais um cilco da vida que se encerra, e outro que se inicia. As lágrimas que despencam dos olhos tristes são de uma saudade antecipada, temperadas apenas com uma dose de possessividade das mães para com suas crias.

E nós sabemos que a autonomia e a liberdade são duas moças muito aprazíveis, mas a acompanha uma senhora um tanto exigente chamada responsabilidade. Porque vai chegar a hora que irão tocar a sua campanhia pedindo para falar com o(a) dono(a) da casa, e você vai ter que dizer:"Sou eu!".

Mas isso a gente aprende, nem que seja através de martelada. Por que a vida, viu, é assim: enquanto a gente não morre, a gente aprende.

Ponderações (necessárias) à parte, você há de convir o quão bonito é um filho que se emancipa, que, como diziam nossas mães, com licença Dona Betânia, tornam-se donos(as) dos seus narizes.

Eu na casa de um amigo, pego um cigarro e vou me dirigindo lentamente até a porta, quando sou interrompido:

- Pode ficar aí, camarada, a casa é minha.

Foi uma das coisas mais belas que já ouvi.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

As Comportas Se Abriu, Laiá lalaiá

Foi há quase uma semana, precisamente na quinta-feira, quinto dia do mês corrente. Eu estava, como de praxe, na sala 173 da Reitoria, vendendo minha força de trabalho por um auxílio miserável, apenas para me manter na UFPE.

Era fim de expediente, eu já me dava como 'largado', e estava no computador, gerenciando as minhas mil redes sociais. No facebook, vejo o aviso no mural de vários amigos: "A UFPE cancela as aulas da noite" ou "Não haverá aulas na UFPE hoje", ou qualquer coisa que o valha.

Até então, não sabia dos motivos, mas desconfiava que fosse por causa da chuva. Achei muito estranho, pois aquele era o dia que menos tinha chovido naquela semana. Mas tudo bem, quero nem saber, vou embora para casa, foi o que eu pensei.

Chego na parada, acendo um cigarro, compro uma 'jujuba', mas o ônibus demora. Rapidamente, começo a ouvir os comentários:"Vai dar cheia e esse ônibus não chega!".

Como o ônibus insistisse em não chegar, resolvi ir até o meu querido prédio, o CFCH.

No caminho, pessoas correndo, aflitas, carros saindo às pressas. Apenas para me certificar, pergunto a uma moça que passava correndo, de longe:"Vai ter aula hoje?", ela responde:"Foi cancelaaado, vem água aí!".

Continuo andando, perto do CAC, um gringo em pânico me diz com um português arrastado:"As comportas se abriu!". Eu me finjo de espantado:"Com'é que é?", ele responde, já distante:"Tapacurá! Tapacurá!".

Pronto, já sabia o que estava acontecendo. Uma reedição do que ocorreu em 1975, época em que eu não era nem nascido, quando se espalhou por toda a cidade o boato de que a barragem de Tapacurá tinha se rompido. Dessa vez, versão 2011, eras as comportas que tinham sido abertas. As comportas da barragem de Tapacurá que, pasmem, nem comportas tem.

No DA de Ciências Sociais um informativo criativo:"Leilão do DACS cancelado por motivos aquáticos". Ri à beça, enquanto resolvia com Frances, Bruna e Berlano para qual bar iríamos. Nesse momento, Kleiber já nem podia subir no prédio "por determinação do reitor".

Minha mãe me liga e tasca a frase clássica, ouvida por tanta gente naquele dia:"Meu filho, você tá aonde?". Disse onde estava, que iria demorar um pouco para chegar, mas que tudo estava tranquilo, que ela nem precisava esquentar a cabeça. Mas ela continuou aflita, nervosa, falando dez palavras por segundo, aí eu tive que usar a tática do 'Relaxa, mãe'. Repeti "Relaxa, mãe" umas cem vezes, até ela desligar o telefone na minha cara.

Vou para o bar, bebo uma cerveja não muito boa, mas que quebra o galho, jogo dominó, ganho várias partidas com minha companheira Frances, mas levo duas buchudas de Kleiber. Tô engasgado até agora. Ruivo, se ligue, tem volta.

No final da noite, volto para casa chateado por não ter dinheiro para ir ver Odair José e Reginaldo Rossi no Festival da Seresta, mas tranquilo, espalhado num ônibus vazio, contente por não ter pego engarrafamento, parodiando Chico Buarque:

"Hoje as comportas se abriu, laiá lalalaiá"

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Como uma Pétala

Como uma Pétala

Procure pelas pétalas douradas do girassol
Voando nas costas do vento elas vão
Até lugares longínquos
Onde a vida é um sorriso

Eu queria viver a sua ilusão
Rasgar a mortalha do tempo
Nunca crescer, para sempre jovem ser
Longe da falta que o coração inunda

Se eu pudesse seguir a primavera
Se eu pudesse ser uma pétala
Eu encontraria Deus e o abraçaria
Uma paixão bela eu também provaria

Escrevendo ilusões para ninguém
Talvez um dia as poesias sejam ouvidas
E os anseios do garoto que elas velam
A beleza de um sentimento sincero

Enquanto isso as pétalas dançam...
Em nome do tempo que já foi e nunca esteve
Em nome de um coração amante
Em nome do poeta triste

Seu eu pudesse ser como luz
E voar entre tempos e dimensões
Seu eu pudesse ser uma pétala
Ao mundo mágico carregado seria.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Três Pães de Queijo

Quando eu cursava a 7ª série do Ensino Fundamental, ali por volta dos 12 ou 13 anos de idade, meu grande sonho era comer três pães de queijo na hora do recreio. Sonho pequeno, eu sei. Mas quase todos os meus colegas, de séries anteriores e posteriores, podiam comer três pães de queijo na hora do intervalo. Se não o faziam, era simplesmente porque não queriam. Eu não fazia. Não fazia porque não podia.

Em dia bom, papai e mamãe folgados financeiramente falando, eu comia um. Apenas um pão de queijo. O que, saliente-se, era muito triste! Eu não sabia o que era pior, não subir naquele banco redondo da lanchonete, que era o que corriqueiramente acontecia, pois eu estava sempre sem grana para os ditos três pães, ou subir e descer rapidamente, comendo apenas um, não gozando plenamente da minha glória. Coito interrompido, ora pois.

Alimentei esse meu 'complexo de vira-latas' por um bom tempo.

Alguns anos depois, quando eu já havia deixado a escola, resolvi que era o momento de matar meu desejo de uma vez por todas. Suei mais do que o marcador de Messi, se a paráfrase atualizada com o grande Sérgio Porto é válida, para conseguir separar um trocado para o três pães de queijo. Ganhava uma merreca como estagiário, vivia com a corda no pescoço.

Mas me organizei, guardei o dinheiro e fui lá. Cheguei seguro de mim, confiante na vitória, me espalhei no banco, sorriso que alcançava as duas orelhas, enchi a boca e disse:

- Três pães de queijo, e uma coca para acompanhar. Por favor.
- A gente não vende isso mais não! Esse pão seboso e remoso não tava dando mais lucro!

A respota da dona da lanchonete abalou meu coração. Com toda certeza, eu seria uma pessoa mais feliz se tivesse comido os três pães de queijo.