Pego no armário um livro, obviamente, para ler. Sem plena noção do gesto, eu, súbito, o levo até o nariz: - sorvo o cheiro de literatura. Sim, meu caro, admito, minha amiga, é fetiche na mercadoria. O velho barbudo, ele explica.
Mas, com a licença da palavra, não ligo se ela lhe fere os ouvidos: foda-se! Gosto mesmo do livro, e pronto, fica por isso mesmo.
Afogo o rosto naquelas páginas amareladas. Sedento, vou iniciar mais uma releitura, e a alegria de saber a belezura que vou encontrar ali toma conta de mim: pareço um cachorro impaciente saciando sua fome.
Folheio o livro, rapidamente, da primeira à última página, de modo a projetar um vento leve nas minhas fuças. Aquilo que aspiro não é simplesmente odor de tinta e papel de uma corriqueira máquina gutemberguiana, é o perfume das palavras devidamente escolhidas e ajustadas, justapostas, trabalho ourivesco, coisa mais linda!
Agora contraio o livro contra o peito: preparo a mim e a ele para mais um sessão de rabiscos, grifos, marcações, anotações. Ou melhor: - preparo-nos para o início de nosso diálogo.
Ainda de olhos fechados imagino o contentamento do autor se soubesse desse meu namoro com a sua cria, sua obra-prima!
E, de repente, chego à conclusão: quando um leitor disseca um livro, não com os olhos atentos da leitura, mas com nariz, boca, face toda e mãos, aí sim podemos dizer: - eis a maior glória de um escriba!
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