segunda-feira, 9 de maio de 2011

As Comportas Se Abriu, Laiá lalaiá

Foi há quase uma semana, precisamente na quinta-feira, quinto dia do mês corrente. Eu estava, como de praxe, na sala 173 da Reitoria, vendendo minha força de trabalho por um auxílio miserável, apenas para me manter na UFPE.

Era fim de expediente, eu já me dava como 'largado', e estava no computador, gerenciando as minhas mil redes sociais. No facebook, vejo o aviso no mural de vários amigos: "A UFPE cancela as aulas da noite" ou "Não haverá aulas na UFPE hoje", ou qualquer coisa que o valha.

Até então, não sabia dos motivos, mas desconfiava que fosse por causa da chuva. Achei muito estranho, pois aquele era o dia que menos tinha chovido naquela semana. Mas tudo bem, quero nem saber, vou embora para casa, foi o que eu pensei.

Chego na parada, acendo um cigarro, compro uma 'jujuba', mas o ônibus demora. Rapidamente, começo a ouvir os comentários:"Vai dar cheia e esse ônibus não chega!".

Como o ônibus insistisse em não chegar, resolvi ir até o meu querido prédio, o CFCH.

No caminho, pessoas correndo, aflitas, carros saindo às pressas. Apenas para me certificar, pergunto a uma moça que passava correndo, de longe:"Vai ter aula hoje?", ela responde:"Foi cancelaaado, vem água aí!".

Continuo andando, perto do CAC, um gringo em pânico me diz com um português arrastado:"As comportas se abriu!". Eu me finjo de espantado:"Com'é que é?", ele responde, já distante:"Tapacurá! Tapacurá!".

Pronto, já sabia o que estava acontecendo. Uma reedição do que ocorreu em 1975, época em que eu não era nem nascido, quando se espalhou por toda a cidade o boato de que a barragem de Tapacurá tinha se rompido. Dessa vez, versão 2011, eras as comportas que tinham sido abertas. As comportas da barragem de Tapacurá que, pasmem, nem comportas tem.

No DA de Ciências Sociais um informativo criativo:"Leilão do DACS cancelado por motivos aquáticos". Ri à beça, enquanto resolvia com Frances, Bruna e Berlano para qual bar iríamos. Nesse momento, Kleiber já nem podia subir no prédio "por determinação do reitor".

Minha mãe me liga e tasca a frase clássica, ouvida por tanta gente naquele dia:"Meu filho, você tá aonde?". Disse onde estava, que iria demorar um pouco para chegar, mas que tudo estava tranquilo, que ela nem precisava esquentar a cabeça. Mas ela continuou aflita, nervosa, falando dez palavras por segundo, aí eu tive que usar a tática do 'Relaxa, mãe'. Repeti "Relaxa, mãe" umas cem vezes, até ela desligar o telefone na minha cara.

Vou para o bar, bebo uma cerveja não muito boa, mas que quebra o galho, jogo dominó, ganho várias partidas com minha companheira Frances, mas levo duas buchudas de Kleiber. Tô engasgado até agora. Ruivo, se ligue, tem volta.

No final da noite, volto para casa chateado por não ter dinheiro para ir ver Odair José e Reginaldo Rossi no Festival da Seresta, mas tranquilo, espalhado num ônibus vazio, contente por não ter pego engarrafamento, parodiando Chico Buarque:

"Hoje as comportas se abriu, laiá lalalaiá"

Um comentário:

Álvaro Botelho disse...

muito bom Rosano sinceramente o ethos da cidade no dia tava igual ao apresentado pelos personagens, diga-se de passagem pessimamente construídos, do filme o dia depois de amanhã